Não adoecemos porque fomos ao shopping, à praia, a uma festa… Adoecemos porque estávamos cuidando dos doentes. E isso que é vergonhoso: não só o governo de Itajaí, mas também os estaduais, federal, deixarem de reconhecer que esses profissionais adoeceram lutando pela saúde do país.

Em declaração à BBC Brasil, a médica Priscila Daflon, que trabalha em Itajaí, traz um retrato de como as autoridades têm tratado a saúde pública no Brasil. Infectada por Covid-19, Priscila teve negado o reconhecimento de que contraiu a doença no trabalho. Essa prerrogativa facilita a obtenção de auxílios e oferece segurança a profissionais afastados por enfermidades típicas da ocupação.

O governo federal não considera a Covid como doença ocupacional. A prefeitura de Itajaí alega que, para reconhecê-la, os profissionais de saúde devem comprovar o vínculo exclusivo com o município. Na justificativa, a prefeitura argumenta que muitos servidores atuam também em outras frentes, o que inviabiliza o reconhecimento de que a doença foi contraída no trabalho. Meramente burocrática, a medida imputa aos médicos e enfermeiros da linha de frente no combate à pandemia o ônus de arcar com evidências pouco prováveis de se conseguir.

Como se sabe, o monitoramento da Covid-19 depende de estratégias de testagem para isolar os infectados e as pessoas com as quais tiveram contato. É a forma mais eficiente de diminuir a curva de contágio até o momento. A médica, no entanto, teve de arcar com os custos do teste molecular (o que identifica a presença do vírus no organismo), uma vez que só os testes rápidos estavam disponíveis. No caso de Priscila, o teste PCR deu negativo porque foi realizado fora do prazo considerado adequado para a identificação do vírus.

Mais que aplausos, merecemos respeito!

Publicado por Priscila Daflon em Terça-feira, 27 de outubro de 2020
Postagem de Priscila Daflon no seu perfil do Facebook

A esta realidade estão sujeitos todos os profissionais de saúde espalhados pelo país. Em agosto, uma pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos da Burocracia, da Fundação Getúlio Vargas, apontava que 74% dos pouco mais de mil profissionais entrevistados não se sentiam preparados para lidar com a pandemia. De cada 100, só 11 tinham sido testados e metade recebeu equipamentos adequados para o dia a dia. O principal problema, no entanto, tinha a ver com o estresse emocional, especialmente pelas agressões de parte da população, cujas posições sobre os efeitos da pandemia são negacionistas. O estudo “A pandemia de Covid-19 e os profissionais de Assistência Social no Brasil” concluía na época sua segunda fase e respaldava importantes pontos de vista sobre as políticas públicas de saúde, mesmo sem um valor amostral estatístico capaz de sugerir interpretações mais universais. Os detalhes estão no documento abaixo.

Nichos de expansão

Em termos gerais, a pandemia do novo coronavírus no Brasil parece estar dando uma trégua. Ao se analisar os números gerais, percebe-se uma queda na média móvel de mortos, tendência que vem se confirmando desde o final de agosto. Também a média de casos tem se mantido estável desde meados de setembro. Os dados positivos, contudo, vêm gerando um afrouxamento de medidas sanitárias considerado inadequado por especialistas, uma vez que uma campanha de vacinação eficiente ainda está distante.

Prefeitos de quatro municípios da região da Grande Florianópolis, em Santa Catarina, decidiram agir em conjunto para evitar aglomerações no feriadão de finados, no início de novembro. Três dos quatro municípios envolvidos (Florianópolis, São José e Palhoça) tiveram uma alta considerável de casos diários nas últimas semanas, especialmente depois da concentração excessiva de pessoas em praias e bares da região em outro feriado, em meados de outubro. As medidas consideram, inclusive, o uso de forças de segurança locais e estaduais.

Peço a atenção especial de todos os moradores de Florianópolis. Hoje tivemos uma conversa entre prefeitos da região e secretário estadual de saúde sobre o avanço da Covid. Algumas informações importantes 👇🏻👇🏻

Publicado por Gean Loureiro em Terça-feira, 27 de outubro de 2020
Prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro, em apelo nas mídias sociais

O NOVO AVANÇO DA COVID-19O número de casos da doença voltou a subir na nossa região. Hoje, junto com os prefeitos de…

Publicado por Adeliana Dal Pont em Terça-feira, 27 de outubro de 2020
Prefeita de São José, Adelina Dal Pont, também recorre à mídias sociais

Preocupa as autoridades o aumento de internações em Unidades de Terapia Intensiva, especialmente na última semana. De acordo com os sites oficiais das prefeituras de Florianópolis e São José, municípios vizinhos, os leitos de UTI têm ocupação acima de 80%. Considerando que a quase totalidade dos leitos disponíveis na macrorregião de saúde da Grande Florianópolis está concentrada nos dois municípios, os impactos na estrutura do Sistema Único de Saúde são enormes. Só em Florianópolis, responsável por cerca de 70% dos leitos, dos 189 disponíveis, 132 estavam ocupados em 28/10.

Desde o dia 13, pós feriadão de outubro, Florianópolis, São José e Palhoça juntos respondem por um terço da média móvel diária de casos em Santa Catarina. E a incidência vem aumentando proporcionalmente, como mostra o gráfico abaixo. Os três municípios não exerciam forte impacto sobre os números no estado, como se percebe, até o início de outubro. Nesse mês fica evidente a similaridade na curva de crescimento total no estado e nos municípios somados. Medidas restritivas se mostram necessárias para conter o avanço da pandemia, mas, as que foram tomadas agora têm sofrido muitas críticas por negligenciarem o fechamento de ambientes públicos e a determinação de isolamento social mais drástica.

Pelas recentes declarações do secretário de Saúde de Florianópolis, Carlos Alberto Justo, não há qualquer perspectiva de procedimentos mais rígidos contra a falta de conscientização a respeito das restrições necessárias para conter o avanço de casos na região. O poder público, alega, está sendo pressionado por setores que exigem o lockdown e outros que querem mais flexibilidade nas medidas. Como resposta, o município manteve as restrições já existentes e pretende fiscalizar os espaços públicos no feriado de finados. Para o secretário, se as medidas que já estão em vigor não são levadas a sério, não adianta endurecer ainda mais o controle. Como candidato à reeleição, o prefeito Gean Loureiro está numa posição difícil. Às vésperas do pleito e em recuperação da Covid, tomar medidas impopulares pode representar perdas consideráveis no jogo político.

Nova onda

No Amazonas não houve outra saída. Os casos de Covid voltaram a crescer e o sistema de saúde está novamente comprometido, diante da quantidade de internações. Para evitar o estrangulamento da estrutura hospitalar o governo estadual prorrogou o fechamento de lugares públicos que promovem aglomerações, como praias, bares e casas de show. Só em Manaus, de acordo com o painel de monitoramento da pandemia, os leitos de UTI apresentam (28/10) uma taxa de ocupação de 79%. Para o governador Wilson Lima, as campanhas políticas são as principais responsáveis pelo aumento dos números no estado.

Nos últimos dois meses, Manaus tem concentrado a metade dos casos diários do Amazonas, considerando a média móvel de sete dias. No gráfico abaixo é possível analisar que a curva de registros na capital acompanha a do estado. Os picos são bastante similares, o que mostra uma incidência maior de casos em Manaus, diante dos registros feitos nos demais municípios. Os especialistas reservam especial atenção ao caso amazonense, visto que essa nova onda pode ajudar a entender o comportamento do vírus em um quadro fora da sazonalidade de síndromes respiratórias no Brasil. Tinha-se como evidência que os picos registrados em maio no Amazonas estavam relacionados ao período em que a região Norte regularmente atesta maior incidência de síndromes respiratórias provocadas por outros vírus.

Ainda não há respostas concretas, mas o monitoramento das regiões que vêm apresentando curvas mais elevadas, como no Amazonas e em Santa Catarina, pode ajudar no planejamento de medidas para contenção da doença. É importante o alerta. Outros estados, como o Rio Grande do Sul, também têm apresentado alta no registro diário de casos. Especialmente Manaus e os três maiores municípios da Grande Florianópolis (Florianópolis, São José e Palhoça) contabilizam uma mudança drástica na perspectiva de controle que se vinha experimentando no caso da Covid-19. Vistos de forma localizada, os picos de Covid não estão assim tão distantes quanto parece.

Hits: 31

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *